quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Sara Ocidental: A intifada esquecida


Rabuni – Todos os portugueses conhecem a intifada palestiniana mas a maioria desconhece que no segundo país mais próximo de Portugal, Marrocos, está em curso outra intifada reprimida com extrema violência pelo reino alauita.
«São vocês que têm de explicar porque é que a maior parte dos órgãos de comunicação social não falam na intifada saraui em Marrocos» reage Khalil Sidi M’Hamed, Ministro dos Territórios Ocupados e da Diáspora da República Árabe Saraui Democrática (RASD) quando questionado sobre o silêncio da imprensa internacional face à intifada saraui.

Desencadeada em Maio 2005 por estudantes sarauis da universidade de Rabat, a intifada tornou-se num quebra-cabeças para a monarquia marroquina que tenta abafar a existência de um levantamento saraui nos territórios do Sara Ocidental controlado por Marrocos mas já se estende a todo o país. Uma situação que não passou despercebida à delegação ad hoc do Parlamento Europeu que se deslocou no final de Janeiro a Layoune, como constatou a Amnistia Internacional.

Depois de ter defendido que a Frente Polisário era um movimento terrorista Rabat não hesita em reprimir com extrema violência qualquer manifestação pela autodeterminação do Sara Ocidental, e longe das paradisíacas fotografias turísticas Marrocos vai superlotando as suas prisões (foto) com amontoados de manifestantes acusados de serem perigosos destabilizadores do reino.

Uma concentração de jovens sarauis, a aclamação de um slogan pela autodeterminação ou desenhar clandestinamente uma bandeira da RASD resulta imediatamente numa reacção das forças de segurança marroquinas que multiplicam as detenções arbitrarias e submetem os «revoltosos» a múltiplas torturas frequentemente denunciadas pelas ONG’s internacionais.

As manifestações pacíficas transformaram-se entretanto em acções de resistência, e qualquer sinal de repressão degenera rapidamente numa chuva de pedras contra a polícia de choque marroquina. Imagens que Rabat tenta ocultar mas a Polisário, e os manifestantes sarauis, difundem através da YouTube e Dailymotion.

Qualificando de «guerrilha pacífica» Khalil Sidi M’Hamed afirma que a intifada saraui faz parte da «causa do povo» e da luta da Frente Polisário, «cada indivíduo que está nos campos de refugiados sarauis (na Argélia) tem um electrão na intifada» sublinha. Segundo o Ministro dos Territórios Ocupados e da Diáspora da RASD a acção da intifada provocou que Marrocos impedisse que ONG’s de defesa dos Direitos Humanos se deslocassem ao Sara Ocidental, onde Rabat tenta ocultar «valas comuns com vítimas sarauis».

Para Khalil Sidi M’Hamed a Intifada saraui «é como a Revolução Laranja (Ucrânia)», onde participam todas as camadas sociais, e garante que vai continuar a dilatar e alastrar por todo o território marroquino porque «quando um país está sob ocupação todos tornam-se resistentes».

Marrocos apenas reconhece cinco vítimas mortais da intifada, e a Polisário avança que desde 2005 a acção das forças de segurança marroquinas contra a «guerrilha pacífica» resultou em «centenas de vítimas», entre os mortos, feridos e torturados.

No último relatório da Human Rights Watch foi assinalado que os militantes sarauis e os defensores dos direitos humanos continuam a ser vítimas de «perseguições e assédio perpetrado pelas autoridades marroquinas que tentam desacreditar estes militantes acusando vários de utilizarem os direitos humanos com o pretexto para apoiarem “acções separatistas” da Polisário, por vezes com violência». Segundo a mesma ONG para os manifestantes sarauis a recusa marroquina do direito à autodeterminação é uma violação dos direitos humanos.

Face às pressões internacionais Marrocos foi forçado a levantar a pressão sobre as populações do Sara Ocidental e permitir a circulação dos activistas dos direitos humanos sarauis, os quais acabaram por se tornar nos símbolos da intifada e nos principais embaixadores das denúncias de violações dos direitos humanos praticadas nestes territórios. Foi este quadro que permitiu a Aminatu Haidar, sobrevivente das prisões e torturas marroquinas, se tornar na porta-voz itinerante das populações sarauis nos territórios do Sara Ocidental controlado por Marrocos e recentemente recebeu em Washington o prémio de defensora dos direitos humanos atribuído pelo Centro Robert F. Kennedy.

O bloqueio mediático à Intifada no Sara Ocidental prossegue dado que Marrocos não quer ver manchada a sua proposta de autonomia para o território o qual a Frente Polisário rejeita. Perante o impasse de um cessar-fogo que dura há quase duas décadas, dos fiascos acumulados das negociações entre Rabat e a Polisário sob os auspícios da ONU, e face à indiferença internacional relativamente ao «levantamento saraui» a intifada pode disparar e «tudo é possível acontecer a curto prazo», reconheceu Khalil Sidi M’Hamed.

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